STJ ao julgar Tema 1.203 pacifica a plena validade do Seguro Garantia

  • Por:Cunha de Almeida
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O julgamento, pelo Superior Tribunal de Justiça, do recurso que originou o Tema Repetitivo n.º 1.203 representa um marco relevante na consolidação de um entendimento há muito aguardado pelos operadores do Direito e pelo setor empresarial: a plena validade e eficácia do seguro garantia e da fiança bancária para fins de suspensão da exigibilidade de créditos não tributários.

Com essa decisão, a Corte reafirma a importância da boa-fé nas relações processuais, prestigia a lógica econômica das garantias e contribui para um sistema mais equilibrado entre a defesa dos interesses do credor e a preservação da atividade produtiva dos devedores.

A controvérsia e sua repercussão prática

Antes da fixação da tese repetitiva, prevalecia entre os tribunais brasileiros a incerteza quanto à possibilidade de que o oferecimento de seguro garantia judicial ou fiança bancária, por si só, pudesse suspender a exigibilidade de créditos não tributários.

Parte do Judiciário exigia o depósito judicial em dinheiro como única forma hábil a impedir medidas coercitivas, como o protesto do título, a inscrição em cadastros de inadimplentes e o ajuizamento de execuções.

Essa instabilidade interpretativa comprometia severamente a previsibilidade do sistema e impunha ônus excessivo às empresas, que se viam obrigadas a imobilizar significativas importâncias – ainda que estivessem exercendo, de forma legítima, o seu direito de questionar a legalidade do débito em juízo.

O julgamento do Tema 1.203

Foi com esse pano de fundo que a Primeira Seção do STJ afetou os Recursos Especiais n.ºs 2.007.865/SP, 2.037.787/RJ e 2.050.751/RJ, para julgamento sob o rito dos repetitivos. A tese firmada, de forma unânime e com força vinculante, foi a seguinte:

O oferecimento de fiança bancária ou de seguro garantia, desde que corresponda ao valor atualizado do débito, acrescido de 30% (trinta por cento), tem o efeito de suspender a exigibilidade do crédito não tributário, não podendo o credor rejeitá-lo, salvo se demonstrar insuficiência, defeito formal ou inidoneidade da garantia oferecida.”

A decisão, proferida em 11 de junho de 2025, pacificou o entendimento de que não há justificativa para se impor ao devedor a realização de depósito judicial em dinheiro, quando já ofertado seguro garantia ou fiança bancária idôneos, suficientes e regularmente constituídos.

Segurança jurídica e isonomia

A principal virtude da tese firmada reside em sua capacidade de restaurar a segurança jurídica e a isonomia no tratamento dos litigantes. Até então, empresas em idêntica situação processual poderiam receber respostas diametralmente opostas a depender da interpretação do juízo local. Com a uniformização do entendimento, o STJ coloca fim a essa disparidade, garantindo que todos os jurisdicionados tenham acesso ao mesmo padrão decisório.

Mais do que isso, a Corte reafirma que a finalidade das garantias judiciais é assegurar o resultado útil do processo e não de impor uma sanção antecipada ou criar embaraços desnecessários ao exercício do direito de defesa.

O seguro garantia e a fiança bancária são instrumentos regulamentados, fiscalizados e amplamente aceitos no ordenamento jurídico, com liquidez compatível à satisfação dos créditos eventualmente devidos.

Eficiência econômica e proteção da atividade empresarial

Do ponto de vista prático, a decisão favorece a racionalização de recursos e a continuidade das atividades empresariais. Ao reconhecer a plena eficácia do seguro garantia e da fiança bancária, o STJ permite que empresas possam manter sua liquidez, evitar a paralisação de projetos e conservar sua capacidade de investir e contratar.

Conforme ressaltado por especialistas, a exigência de depósito judicial em dinheiro, além de desproporcional, impõe custos excessivos, imobiliza capital produtivo e compromete a competitividade das empresas.

A nova tese, ao contrário, concilia o interesse do credor com o princípio da menor onerosidade ao devedor, e alinha-se às melhores práticas de gestão de risco no contencioso administrativo e judicial.

Consequências operacionais e processuais

Na prática, credores não poderão mais recusar, sem justificativa técnica, o seguro garantia ou a fiança bancária.

A rejeição da apólice somente será admissível se demonstrada, de forma objetiva, repita-se, a insuficiência do valor, a inidoneidade da instituição garantidora ou defeitos formais que comprometam a eficácia da garantia, como constou de um dos acórdãos condutores da temática: “A idoneidade da garantia deve ser aferida com base na conformidade de suas cláusulas com as normas expedidas pelas autoridades competentes, sendo que a simples estipulação de um prazo de validade determinado não enseja, por si só, sua inidoneidade.

Além disso, enquanto a apólice estiver vigente e nos moldes exigidos pela tese repetitiva, não poderão os credores adotarem medidas constritivas, típicas ou atípicas.

O equilíbrio entre credor e devedor

A tese firmada reflete um equilíbrio fundamental: protege o direito do credor, ao exigir garantias sólidas e adequadas, mas assegura ao devedor a liberdade de escolher a modalidade menos gravosa de caução. O STJ reconhece, assim, que não se pode exigir do devedor a entrega de seu capital em espécie quando há outras formas legalmente previstas e igualmente eficazes de assegurar o juízo.

Inclusive, em um dos acórdãos que amparou a tese repetitiva, assim constou: A fiança bancária e o seguro garantia judicial, além de atenderem ao princípio da menor onerosidade (art. 805 do CPC/2015), produzem os mesmos efeitos jurídicos que o depósito em dinheiro, garantindo segurança e liquidez ao crédito do exequente.

Esse entendimento também serve como guia interpretativo para juízes de primeira instância, evitando decisões arbitrárias ou desproporcionais, e reforça o papel do Judiciário como garantidor de segurança jurídica, coerência e previsibilidade.

Considerações finais

O julgamento do Tema 1.203 não apenas pacifica uma controvérsia jurisprudencial relevante, como também fortalece a confiança do jurisdicionado no sistema judicial, reafirma a legitimidade dos instrumentos modernos de garantia e contribui para um ambiente de negócios mais estável e eficiente.

O seguro garantia, assim como a fiança bancária, emergem do julgamento valorizados, não apenas como mecanismos processuais, mas como ferramentas legítimas e eficazes de proteção aos interesses dos litigantes.

 

Mathias Menna Barreto Monclaro – OAB/PR 66.373

Postado em: Notícias STJ

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