Recente decisão da Corte Especial do STJ em julgamento de recurso repetitivo -Tema 1.235, devolveu perspectiva aos credores com demandas judicializadas: a impenhorabilidade de depósitos e/ou aplicações bancárias com valor de até 40 (quarenta) salários mínimos não pode ser reconhecida de ofício, mas somente após a prova, pelo devedor, da impenhorabilidade.
Assim restou definida a tese: “A impenhorabilidade de quantia inferior a 40 salários mínimos (art. 833, X, do CPC) não é matéria de ordem pública e não pode ser conhecida de oficio pelo juiz, devendo ser arguida pelo executado no primeiro momento em que lhe couber falar nos autos ou em sede de embargos à execução ou impugnação ao cumprimento de sentença, sob pena de preclusão.”
Tal conclusão, obtida por unanimidade de votos, põe fim a desalinhada interpretação que vinha sendo adotada por algumas Turmas do STJ a respeito da natureza jurídica das regras de impenhorabilidade, eliminando a roupagem de matéria de ofício dada ao artigo 649 do CPC/73 e, em substituição, ao artigo 833 do CPC/15.
Desde os primeiros julgados sobre o tema, no ano de 1999, as Turmas tinham entendimentos divergentes sobre ser a impenhorabilidade de bens do executado direito disponível ou matéria de ordem pública a ser reconhecida de ofício pelo julgador.
Em um primeiro enfrentamento do tema pela Corte Especial ano de 2014 e, portanto, ainda sob a égide do CPC/73, a controvérsia foi pacificada no sentido de que a impenhorabilidade do bem arrolado no artigo 649 (exceto o bem de família) é direito disponível do devedor e, portanto, deveria ser arguida pelo executado no primeiro momento em que lhe coubesse falar nos autos, sob pena de preclusão.
No entanto, a partir do final do ano de 2022 percebeu-se que alguns julgados das Turmas de Direito Público do STJ, por aplicação direta de precedente que tratava de hipótese distinta (incompetência absoluta) e sem qualquer contextualização direta em relação à impenhorabilidade de bens, voltaram a aplicar o entendimento controverso de que a impenhorabilidade seria matéria de ordem pública e, portanto, declarada de ofício pelo juiz.
Ressalta ainda a Ministra Relatora NANCY ANDRIGHI que, da análise do inteiro teor desses julgados que aplicaram o entendimento controverso, sequer se pode identificar qual seria a razão determinante para a conclusão sobre a natureza de matéria de ordem publicada dada à impenhorabilidade.
Diante disso, o recente julgado da Corte Superior – Tema 1235 veio a corrigir a trajetória jurisprudencial sobre a matéria, sedimentando o entendimento correto ao artigo 833 do CPC/15 no sentido de que a prevista impenhorabilidade é relativa e, portanto, para ser reconhecida, exige do devedor prova nesse sentido e dentro do prazo determinado.
Dentre os fundamentos, cabe destacar que a nova redação dada pelo Código de Processo Civil de 2015 suprimiu do caput do substituído artigo 649 a expressão ‘absolutamente impenhoráveis’, permanecendo apenas a palavra ‘impenhoráveis’, o que já se denota indicativo de relativização da impenhorabilidade.
O novo diploma processual também passou a prever expressamente, em casos de penhora sobre dinheiro em depósito ou aplicação financeira, prazo preclusivo para o devedor fazer prova da impenhorabilidade da quantia bloqueada (artigo 854, § 3°, I e § 5°, do CPC/15), ou seja, outro nítido objetivo de flexibilização das regras relativas à impenhorabilidade. Vale lembrar que tal dispositivo tem origem no artigo 655-A, § 2°do CPC/73, o qual já previa a necessidade do devedor em fazer prova da impenhorabilidade de quantias depositadas em contas correntes.
Ainda, bem observou o acórdão que “quando o CPC/2015 objetivou autorizar a atuação de ofício pelo juiz nessa matéria, o fez de forma expressa, como no § 1° do referido art. 854, admitindo tão somente que o juiz determine, de ofício, o cancelamento de indisponibilidade que ultrapasse o valor executado.”
Portanto, seja em análise do Código de Processo Civil de 1973, ou pelas mudanças trazidas pelo Código de Processo Civil de 2015, a conclusão é a de que a impenhorabilidade é um direito disponível do devedor (pode ser renunciada) e, portanto, não pode ser considerada como matéria de ordem pública pelo magistrado julgador. Cabe ao devedor e a mais ninguém alegar a impenhorabilidade, já que pode ele dispor livremente dos valores contidos em suas contas bancárias e aplicações, inclusive para quitar a própria dívida judicializada.
Ou seja: ou o devedor faz a prova, dentro do prazo legal estabelecido, de que os valores localizados em contas correntes e/ou aplicações são impenhoráveis, como por exemplo, demonstrar que tais valores têm natureza alimentar, salarial ou então previdenciária. Mas, não o fazendo, precluído está seu direito, devendo os valores serem automaticamente convertidos em penhora e, portanto, utilizados para a satisfação do débito.
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